Margaret Wheatley e Debbie Frieze
Por muito tempo, muitos de nós fomos fascinados por heróis. Talvez seja o nosso desejo de ser salvo, de não ter que fazer o trabalho duro, de depender dos outros para resolver as coisas. Constantemente somos bombardeados por políticos que se apresentam como heróis, aqueles que vão resolver tudo e fazer que os nossos problemas desapareçam. É uma imagem sedutora, uma promessa tentadora. E nós continuamos acreditando. Em algum lugar há alguém que vai tornar tudo melhor. Em algum lugar, há alguém que é visionário, inspirando, brilhante, confiável, e todos nós vamos segui-lo felizes. Em algum lugar ...
Bem, está na hora de todos os heróis irem para casa, como o poeta William Stafford escreveu. Está na hora de abrirmos mão destas esperanças e expectativas que apenas geram dependência e passividade, e que não trazem soluções para os desafios que enfrentamos. Está na hora de parar de esperar que alguém nos salve. Está na hora de encarar a verdade da nossa situação - de que estamos todos juntos nisto, de que todos nós temos voz - e descobrir como mobilizar os corações e as mentes de todos em nossos locais de trabalho e comunidades.
Por que continuamos esperando por heróis? Parece que assumimos certas coisas:
• Os líderes têm as respostas. Eles sabem o que fazer.
• As pessoas fazem o que lhes é dito. Elas só têm que receber bons planos e instruções.
• Alto risco exige alto controle. Quando as situações se tornam mais complexas e desafiadoras,o poder precisa ser deslocado para o topo (com líderes que sabem o que fazer.)
Estas crenças dão origem aos modelos de comando e controle reverenciados nas organizações e governos em todo o mundo. Aqueles na base da hierarquia se sujeitam a visão maior e a experiência daqueles acima. Líderes prometem nos tirar dessa confusão; e nós voluntariamente entregamos a nossa autonomia individual em troca de segurança.
A única conseqüência previsível das tentativas dos líderes de assumir o controle de uma situação complexa, até mesmo caótica, é que eles criam mais caos. Eles se isolam com apenas alguns poucos assessores chave, e tentam encontrar uma solução simples (e rápida) para um problema complexo. E as pessoas os pressionam para fazer justamente isso. Todo mundo quer ver o problema a desaparecer; gritos de "consertem-no!" surgem do público. Os líderes se esforçam para que pareça que tudo está sob controle.
Mas as causas dos problemas de hoje são complexas e interligadas. Não há respostas simples, e nenhum indivíduo sozinho pode saber o que fazer. Parece que somos incapazes reconhecer estas realidades complexas. Em vez disso, quando o líder não resolver a crise, nós o demitimos, e imediatamente começar a procurar pelo próximo (mais perfeito). Não questionamos as nossas expectativas dos líderes, não questionamos o nosso desejo por heróis.
A ilusão do controle
Liderança heróica se baseia na ilusão de que alguém pode estar no controle. No entanto, vivemos em um mundo de sistemas complexos cuja própria existência significa que eles são inerentemente incontroláveis. Ninguém está no comando de nossos sistemas de alimentação. Ninguém está no comando das nossas escolas. Ninguém está no comando do meio ambiente. Ninguém está no comando da segurança nacional. Ninguém está no comando! Estes sistemas são fenômenos emergentes - o resultado de milhares de pequenas ações locais que convergiram para criar poderosos sistemas, com propriedades que podem ter pouca ou nenhuma semelhança com as ações menores que deram origem à eles. Estes são os sistemas que agora dominam a vida, eles não podem ser transformados trabalhando a partir de padrões antigos, concentrando-se apenas em algumas causas simples. E certamente eles não podem ser transformados pelas mais ousadas visões dos nossos líderes mais heróicos.
Se quisermos ser capazes de fazer com que esses sistemas complexos funcionem melhor, precisamos abandonar nossa dependência do líder-como-herói, e convidar o líder-como-anfitrião. Precisamos apoiar aqueles líderes que sabem que os problemas são complexos, que sabem que para entender toda a complexidade de qualquer questão, todas as partes do sistema precisam ser convidadas participar e contribuir. Nós como seguidores, precisamos dar tempo, ter paciência, e perdoar os nossos líderes, e precisamos estar dispostos a dar um passo a frente e contribuir.
Estes líderes-anfitriões são sinceros o suficiente para admitir que não sabem o que fazer; eles percebem que é pura tolice confiar apenas neles mesmos para obter respostas. Mas também sabem que podem confiar na criatividade e compromisso de outras pessoas para realizar o trabalho. Eles sabem que outras pessoas, não importa onde estejam na hierarquia organizacional, pode ser tão diligentes, motivadas e criativas quanto o líder, dado o convite certo.
A jornada do herói para o anfitrião
Líderes que fazem a jornada do herói para o anfitrião conseguem enxergar além das dinâmicas negativas da política e da oposição que as hierarquias geram, eles ignoram os organogramas e cargos que confinam o potencial das pessoas. Em vez disso, eles se tornam curioso. Quem faz parte desta organização ou comunidade? Que habilidades e capacidades eles poderiam oferecer se fossem convidados a trabalhar de forma plena? O que eles sabem, que insights eles têm que podem conduzir a uma solução para este problema?
Líderes-anfitriões sabem que pessoas voluntariamente apoiam as coisas que ajudaram a criar, que você não pode esperar que as pessoas 'comprem' os planos e projetos desenvolvidos em outro lugar. Líderes-anfitriões investem em conversas significativas entre pessoas de diversas partes do sistema, como a forma mais produtiva para gerar novos conhecimentos e possibilidades de ação. Eles confiam que as pessoas estão dispostas a contribuir, e que a maioria das pessoas anseia encontrar significado e possibilidade em suas vidas e trabalho. E esses líderes sabem que anfitriar os outros é a única maneira de resolver problemas complexos e difíceis.
Líderes-anfitriões não apenas abrem mão com benevolência e confiam que as pessoas vão fazer um bom trabalho por conta própria. Estes líderes têm muitas coisas para cuidar, mas estas são bastante diferentes do trabalho dos heróis. Líderes-anfitriões devem:
• proporcionar condições e bons processos de grupo para as pessoas a trabalharem juntas.
• fornecer recursos de tempo, o mais escasso recurso de todos.
• insistir que as pessoas e o sistema aprendam com a experiência, freqüentemente.
• oferecer apoio inequívoco - pessoas sabem que o líder está ali para elas.
• conter a burocracia, criando oásis (ou espaços seguros), onde as pessoas são menos sobrecarregadas com demandas absurdas para relatórios e detalhes admistrativos.
• jogar na defensiva com outros líderes que querem retomar o controle e criticam a liberdade excessiva dada as pessoas.
• espelhar para as pessoas regularmente como eles estão se saindo, o que estão conquistando, o quanto progrediram na jornada.
• trabalhar com as pessoas para desenvolver métricas de progresso relevantes, tornando visíveis as suas conquistas.
• valorizar o convívio e a moral - não falsas atividades entusiásticas, mas o espírito que surge em grupos que realizam trabalhos difíceis em conjunto.
Desafios dos Superiores
É importante notar como lideres fazem a jornada do herói para anfitrião usando o poder da sua posição. Eles têm que trabalhar todos os níveis da hierarquia; normalmente é mais fácil conseguir suporte e respeito das pessoas eles lideram do que dos seus superiores. A maioria dos líderes seniores nas grandes hierarquias acredita na sua superioridade inerente, que é provada pela posição que alcançaram. Eles não acreditam que as pessoas comuns são tão criativas ou motivadas como eles são. Quando participação é sugerida como um meio de colher da equipe insights e idéias sobre um problema complexo, líderes seniores freqüentemente bloqueiam essas atividades. Eles justificam a sua oposição afirmando que as pessoas usariam essa oportunidade para tirar vantagem da organização; ou que as pessoas se sentiriam confidentes de mais e exceder os seus papeis. Na verdade, muitos líderes seniores vêem o engajamento de todo o sistema como uma ameaça ao seu poder e controle. Eles consistentemente escolhem o controle, e o caos resultante, ao invés de convidar as pessoas para resolver problemas difíceis e complexos.
Líderes que sabem o valor do engajamento pleno e confiam naqueles que lideram, têm que defender a sua equipe constantemente dos lideres sênior que insistem em mais controle e mais burocracia para cercear suas atividades, mesmo quando essas mesmas atividades estão produzindo excelentes resultados. É estranho dizer, mas muitos líderes seniores escolhem o controle ao invés da efetividade; eles estão dispostos a arriscar criar mais caos, ao continuar exercendo o seu estilo de liderança, baseada em centralização, comando e controle.
Re-engajando pessoas
Aqueles que foram limitados em papéis confinadores, aqueles que foram enterrados na hierarquia, eventualmente vão aflorar e se desenvolver na companhia de líder anfitrião. Entretanto, leva um tempo para que os empregados que o seu chefe é diferente, que este líder realmente quer que eles contribuam. Pode levar mais de um ano em sistemas onde as pessoas foram silenciadas e levadas às submissão por uma liderança autocrática. Hoje em dia a maioria das pessoas tem uma atitude de esperar para ver, não mais interessadas em participar, pois os convites passados não foram sinceros, ou não os engajaram em trabalhos significativos. O líder precisa provar-se continuamente, insistindo que o trabalho não pode ser realizado, nem os problemas resolvidos, sem a participação de todos. Se a mensagem for sincera e consistente, as pessoas gradualmente retornam à vida – mesmo pessoas que morreram no trabalho, que estão somente esperando pela aposentadoria, podem reavivar na presença de um líder que os encoraja e cria oportunidades para que contribuam.
Líderes-anfitriões precisam ser convocadores habilidosos. Eles percebem que a sua organização ou comunidade é rica em recursos, e que a forma mais fácil de descobri-los é juntar pessoas diversas em conversas que importam. Pessoas que não se gostavam, pessoas que se desmereciam e ignoravam, pessoas que se sentiam invisíveis, negligenciadas, excluídas – estas são as pessoas que podem emergir de suas caixas e rótulos para se tornarem colegas e cidadãos interessantes e engajados.
Anfitriar conversas significativas não se trata de fazer com que as pessoas se gostem ou se sintam bem. Trata-se de criar os meios para que os problemas sejam resolvidos, para que times funcionem bem e para que as pessoas se tornem ativistas enérgicos. Líderes-anfitriões criam mudanças substanciais ao contar com a criatividade, o compromisso e a generosidade de todos. Eles aprendem da experiência direta que essas qualidades estão presentes em praticamente todo mundo e em todas as organizações. Eles estendem convites sinceros, fazem boas perguntas e têm a coragem de apoiar a atitude de assumir riscos e a experimentação.
Você é um herói?
Muitos de nós podemos acabar agindo como heróis, não motivados por poder, mas por boas intenções e desejo de ajudar. Você está agindo como herói? Eis como saber. Você está agindo como um herói quando você acredita que apenas trabalhando mais duro você vai consertar as coisas; que apenas se tornando mais esperto, ou aprendendo novas técnicas, você será capaz de resolver os problemas para os outros. Você está agindo como herói se você assumir mais e mais projetos e causas e tiver menos tempo para as relações. Você está bancando o herói se acredita que você pode salvar a pessoa, a situação, o mundo.
Nossos impulsos heróicos freqüentemente nascem das nossas melhores intenções. Nós queremos ajudar, nós queremos resolver, nós queremos consertar. Porém esta é a ilusão de querer ser especial. De que nós somos os únicos que podem oferecer ajuda, serviços ou habilidades. Se não o fizermos, ninguém vai. Este caminho do herói tem apenas um destino garantido – nós acabamos nos sentindo sozinhos, exaustos, não apreciados.
É hora de todos os heróis irmos para casa, porque se formos, vamos perceber que não estamos sozinhos. Estamos cercados por pessoas exatamente como nós. Eles também querem contribuir. Eles também têm idéias. Eles querem ser úteis para os outros e resolver seus próprios problemas.
Verdade seja dita, eles nunca quiserem que os heróis os salvassem, de qualquer maneira.